Trabalho em prosa e poesia

Folheto, de Paulo Dantas

Neste mês do trabalho, a tero apresenta mais uma obra ímpar – desta vez trata-se do mais recente livro de poesia de Paulo Dantas, lançado pela Alpharrabio Livraria e Editora.

Paulo é professor, paraibano, mas vive em São Bernardo há um bom tempo. Apesar do singelo título, Folheto expressa uma poética própria, que só alguém cioso de seu ofício é capaz de ter. Assim, a poesia de Paulo é daquelas que, ao seu modo, puxam pelo fio da tradição oral, feita para ser declamada a plenos pulmões, contra a morte por sufocamento que se alastra por toda a parte. Para a tero, Paulo separou o poema de abertura de Folheto:

primeiro de maio

você já agradeceu
por cortar o dedo picando cebola
e sentiu como arde muito mais

em contato co’a água sanitária
que usa para lavar
o banheiro

e como torna a sangrar quando esfrega
as roupas no tanque
e como torna a doer quando lava

xícaras, panelas, talheres, copos e pratos e
em seguida
começa tudo de novo?

chega uma hora em que o corte
esmorece
entrega os pontos

se dá por vencido e
exaurido
resolve cicatrizar

a dureza do trabalho
invisível
é demais para ele

as mãos insubordinadas
sorriem
como se tivessem todos os dentes na boca

nessas mãos
mora a boniteza
de tum-tum-tuns de zabumba e fraseados de pífano

nessas mãos
mora a determinação
de vulcões, terremotos e dobramentos modernos

nessas mãos
mora o enfrentamento
de frear processos produtivos e cavucar terra seca

nessas mãos
mora a mais aguerrida possibilidade
de parir-se
poesia



Assista: live de lançamento do livro Folheto, de Paulo Dantas

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